Um ser humano normal, sem nada que o distingua, pode perceber um milhão de cores diferentes. Conseguimos perceber tantas cores devido à nossa retina possuir células chamadas cones, de três tipos, cada uma excitada por um comprimento de onda diferente. Quando abrimos os olhos, os sinais luminosos atingem estes cones, que os transformam em sinais eletroquímicos, que por sua vez são enviados ao cérebro. O cérebro combina estes sinais para produzir a sensação que chamamos de cor.
A visão pode ser um processo complexo, mas o cálculo das cores é simples: cada cone confere a capacidade de perceber cerca de uma centena de tons, então o número total de combinações é de pelo menos 100³, ou um milhão. Se eliminarmos um tipo de cone, ou seja, passar de tricromata para dicromata, o número de combinações cai por um fator de 100, para meros 10.000. Quase todos os mamíferos, incluindo os cães e macacos do Novo Mundo, são dicromatas. A riqueza de cores que vemos é rivalizada apenas pelos pássaros e alguns insetos, capazes de perceber parte da região ultravioleta do espectro.
Caçando tetracromatas
Ao longo de duas décadas, a neurocientista da Universidade de Newcastle, Gabriele Jordan, e colegas de pesquisa têm procurado pessoas que tem esta capacidade de super-visão. Dois anos atrás, Jordan finalmente encontrou uma – uma médica vivendo no norte da Inglaterra, conhecida somente como “cDa29″ na literatura científica, é a primeira tetracromata conhecida da ciência. E certamente não será a última.A primeira pista para a existência de tetracromatas surgiu em um trabalho sobre alguns homens daltônicos, feito pelo cientista holandês H. L. de Vries, em 1948. De Vries resolveu testar também as filhas de um dos daltônicos e descobriu que elas podiam detectar uma gama maior de tons de vermelho que a média das pessoas. Isto levou à descoberta de que, quando daltônicos tinham dois cones normais e um cone mutante, a mãe e as filhas tinham um cone mutante e três cones normais, ou seja, quatro cones.
O gene associado ao desenvolvimento dos
cones está no cromossomo X, por isto um homem com esta alteração é
dicromata – ele só tem um cromossomo X, e vai manifestar qualquer
mutação nos genes passados pela sua mãe -, enquanto a mulher pode ser
afetada (podendo ou não apresentar o tetracromatismo) ou apenas ser
portadora do gene.
Em 2007, a Dra. Jordan desenvolveu métodos mais poderosos para identificar mulheres com visão tetracromática, testando 25 mulheres, todas com um quarto cone. Uma delas, identificada como “cDa29″, respondeu corretamente as perguntas que visavam identificar o fênomeno – depois de 20 anos de pesquisas, um tetracromata verdadeiro foi encontrado.
Potencial perdido
A estimativa da Dra. Jordan leva a um mistério: se tetracromatas são tão comuns quanto daltônicos, por que conhecemos daltônicos, mas não conhecemos tetracromatas? O pesquisador de visão Jay Neitz, da Universidade de Washington (EUA), acredita que todas as mulheres com quatro cones têm potencial para visão tetracromática, mas precisam desenvolver ou despertar esta capacidade. “A maior parte das coisas que vemos coloridas são feitas por pessoas que estão tentando criar cores que funcionam para tricromatas. Talvez nosso mundo inteiro esteja sintonizado com o mundo dos tricromatas”, opina.Talvez nosso mundo não tenha tons de cores suficientes para o tetracromatismo ser de algum proveito. Neste caso, os tetracromatas poderiam desenvolver a capacidade se visitassem um laboratório periodicamente, para fazer testes e treinar a percepção.
E como um tetracromata vê o mundo? A mulher “cDa29″ não conseguiu comunicar sua experiência para os pesquisadores, da mesma forma que é impossível descrever a experiência do vermelho para uma pessoa dicromata.
E você, está curioso para saber se é tetracromata? Veja a figura abaixo. Se você conseguir ver letras no centro de algum destes círculos, provavelmente você é um tetracromata.[Digital Journal, Discover Magazine, Ojo Cientifico, Colour Lovers]